Para compreender os eventos de 1932 é necessário retroceder alguns anos e entender como era a política brasileira nas décadas anteriores. Após a instauração da República, em 1889, o poder foi exercido basicamente pelas oligarquias paulista, representada pelo Partido Republicano Paulista (PRP) e mineira, representada pelo Partido Republicano Mineiro (PRM), na chamada “república do café com leite”. Já nos primeiros anos da década de 1920 esse modelo passou a ser contestado por setores sociais de pouca visibilidade ou alijados do poder, como podemos constatar pela Revolução de 1924, pelos movimentos tenentistas, pela Coluna Prestes e pela criação do Partido Democrático (PD) em 1926, como dissidência do PRP.
O ano de 1929 marcou o rompimento entre as alianças paulista e mineira. Os paulistas indicaram Júlio Prestes como candidato à presidência da República e em contrapartida, os mineiros apoiaram a candidatura oposicionista do gaúcho Getúlio Vargas. Um ano depois das eleições, com a vitória de Júlio Prestes, desencadeou-se a Revolução de 1930. Este foi um movimento armado, iniciado em 3 de outubro e liderado pelos estados de Minas Gerais, Paraíba e Rio Grande do Sul, que culminou na deposição do presidente da república Washington Luís em 24 de outubro, impedindo a posse do presidente eleito. Getúlio Vargas assumiu então a chefia do governo provisório em 3 de novembro, data que marcou o fim da chamada República Velha.
O governo de Vargas caracterizou-se pela destituição de líderes locais à frente da política do estado de São Paulo, com a nomeação de interventores, e pela adoção de medidas centralizadoras, em dissonância ao federalismo defendido historicamente pelos paulistas. O estopim da crise entre São Paulo e governo federal, no entanto, foi causado pela suspensão da constituição de 1891 e não sinalização de promulgação de uma nova. Manifestações populares de insatisfação encabeçadas por setores tradicionais da política paulista passam a ser frequentes a partir de janeiro de 1932. Nesse sentido, a morte de quatro estudantes paulistas em confronto com forças do governo e que se tornaram mártires da Revolução – Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo – culminou no MMDC, movimento formado para derrubar o governo varguista.
No dia 9 de julho daquele ano, milhares de paulistas ganharam as ruas da capital e do interior de São Paulo para uma luta armada contra o governo federal. Lançaram mão às armas estudantes, intelectuais, industriais e políticos ligados à República Velha e ao Partido Democrático. Da mesma forma o engajamento de mulheres foi devidamente explorado nas mensagens de convocação dos homens para o alistamento voluntário.
A luta armada dos constitucionalistas que a princípio contava com o apoio de lideranças do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Mato Grosso acabou restringindo-se ao estado de São Paulo com algumas poucas alianças em regiões isoladas. Devido à falta de apoio dos estados vizinhos, o despreparo dos voluntários e a insuficiência de armas, os paulistas não tiveram condições de manter a revolução por muito tempo. A superioridade das tropas federais prevaleceu e em outubro de 1932 as frentes constitucionalistas assinaram a rendição.
Nos anos seguintes houve um processo contínuo de construção da memória do movimento constitucionalista, tornando-o símbolo da identidade paulista. Diversas famílias de combatentes e veteranos mantiveram registros que continuam sob sua guarda. Porém, grande parte foi doada e hoje pertencem aos acervos de museus do estado de São Paulo e acessíveis para o público em geral. São cartas, fotos, diários, manuscritos, objetos de combate, indumentária, dentre outros que possibilitam o amplo acesso a esses elementos que compõem o imaginário social acerca do conflito e de sua representatividade enquanto marco na história paulista e brasileira.